segunda-feira, 30 de abril de 2012

Fim da linha

O ano de 2012 começou de forma trágica para muitas famílias italianas, feridas pela tragédia do suicídio de seus caros. Os desesperados que deram um fim à própria vida são predominantemente do até então próspero norte, mas também do já espremido sul. Somente nos primeiros dias de janeiro registraram-se 12 suicídios. São emblemáticos casos como os ocorridos na meridional Trani, encantadora cidadezinha da Puglia, onde um homem de 49 anos se enforcou no depósito de sua empresa de climatizadores. Ao norte, em Gaggiano, na Lombardia, um eletricista de 64 anos, proprietário de uma pequena atividade, deu um tiro na cabeça. O que aparentemente levou os dois homens ao gesto extremo, segundo relatos da imprensa, foi a situação insustentável causada pela pressão das dívidas e a certeza da falta de saídas a curto prazo.

Talvez o que explique a decisão desses pequenos homens de negócios se suicidarem seja o fato de que eles eram, ao mesmo tempo, empregadores e operários. Frequentemente, seus empregados eram velhos conhecidos, que com eles conviveram uma vida inteira, muitas vezes morando no mesmo bairro ou até na mesma rua. Por isso, para esses pequenos empregadores, tomar a decisão de demitir não significa cumprir um rito impessoal, um gesto corriqueiro num mercado sem rosto humano.

No artigo “Gli imprenditori suicidi caduti sul lavoro”, publicado no jornal Corriere della Sera, Dario Di Vico, autor do livro Piccoli - La pancia del paese (Editora Marsilio, 2010), julga que é preciso considerar os pequenos empresários e artesãos que se suicidam como “caídos do trabalho”, aos quais se deve todo o reconhecimento público. “Eles merecem pelo menos que as associações honrem sua memória, como se faz, justamente, em relação a um grande número de operários que terminam cruelmente seus dias na fábrica, esmagados por uma máquina ou intoxicados por algum veneno.”

Lendo as magras biografias dos suicidas, o jornalista – também autor de “Industrializzazione senza sviluppo” e “Profondo Italia” - descobriu que alguns deles já haviam sofrido golpes violentos em família ou na comunidade. “O individualismo tinha se transformado, de poderoso fator de mobilização de energia, em nua e crua solidão”, avalia Di Vico.

Giuseppe Nicoletto, Paolo Trivellin, Walter Ongaro e outros “caídos do trabalho” citados por Di Vico em seu artigo, representam “casos de empreendedoria corajosa e batalhadora que o mercado conheceu dia a dia, na sua versão mais realista e seletiva, e não naquela visão teórico-acadêmica que se pode encontrar em manuais de management.”

Geralmente, trata-se, na análise do autor de “Piccoli”, de ex-operários que, com muito sacrifício, tinham criado sua própria empresa e que, na nova condição de “patrões” não tinham esquecido o mundo e os sentimentos dos quais provinham. E os dados sobre o emprego e a conjuntura econômica italiana parecem provar isso, reputa Di Vico: “Os ‘Pequenos’, em toda Itália, cortaram os postos de trabalho em proporção mínima em relação a quanto suas empresas perderam em termos de lucro no horribilis 2009. A redução de 30% (que é a média registrada para o período) nunca se tornou 30% a menos de empregados.”

Até o fim, descreve o jornalista, “os artesãos se recusam a dispensar seus próprios colaboradores, até chegarem, alguns, ao trágico paradoxo de se matar antes de demitir alguém com quem assumiram um compromisso na condição de empregadores. O famoso ‘pacto social’, termo que nunca falta nos discursos preparados pelos ghost writer, os Pequenos defendem assim. Com a própria pele.”

Conforme o autor, o que deve ser aclarado e apreendido a partir desses tristes fatos é que, nos vários sistemas de valores que existem nas sociedades modernas, alguns dominam a opinião pública, se afirmam em sua hegemonia e ditam estilos de vida. Outros, ele conclui, “permanecem ocultos, são invisíveis aos demais ou objeto de ironias levianas, mas conservam teimosamente a coerência dos seus códigos de honra”.

É por isso que, para Di Vico não foi excesso de trabalho que matou os Trivellin e os Ongaro: “O que matou esses filhos de um calvinismo menor, e pelo que devem ser respeitados e recordados, foi excesso de ética”.


Nenhum comentário:

Postar um comentário